Londrinenses que há 20 anos frequentam bares e shows de rock pela cidade, eventualmente, se lembram com certa nostalgia de histórias ligadas a shows de nomes como Cherry Bomb e Primos da Cida, alguns até ocorridos em espaços que nem existem mais. Amigos que há 10 anos frequentavam espaços como o ‘El gato Negro’ e shows organizados pela Madame X, até hoje contam com emoção histórias e lembranças da época. Mais recentemente, quem pode ver aos últimos shows do Cólera – ainda com o falecido vocalista Redson – em 2011 na cidade, guarda no coração este pequeno momento como algo histórico, a ser lembrado para os anos futuros. Seguindo esta máxima, é provável que daqui há alguns anos, pequenas lembranças de alguns shows memoráveis, e inspirados da edição 2016 do DemoSul sejam lembrados por quem esteve por lá.

Em sua 16ª edição, e, reunindo estilos musicais variados, o evento, que tem apoio do Programa Municipal de Incentivo à Cultura (PROMIC) e também da Funarte, segue em alta se consolidando como foco de resistência para a música independente – Não somente limitada ao rock – em meio a uma região frequentemente dominada pela música de aproach mais comercial e já, massivamente, oferecida ao público via mídia-convencional. Em uma de suas melhores edições, superior à outra que acompanhamos, em 2010 quando Pato Fu e Tom Zé vieram para a cidade. Outro ponto de destaque foi a rodada de negócios promovida no último sábado (12) que reuniu em um mesmo, um time de peso com produtores e curadores de festivais importantes do Brasil (E também Argentina), entre eles: Abril Pro Rock, Sim SP, e Rec-Beat. bandas puderam conversar com alguns dos produtores, conhecer mais a experiência em outros festivais, e até, mostrar seu trabalho como forma de fazer contatos e, eventualmente, sondar participações em outros eventos. Muitas bandas da região compareceram, levaram cds e até outros materiais como forma de divulgar seus trabalhos.

Sexta-feira (4) – O festival, que abriu os trabalhos no último dia 4, em uma sexta-feira na Concha Acústica, contou em sua abertura com shows De um Filho, De um Cego, na Concha Acústica, passando pelo Blues responsa da Luke de Held & The Lucky Band o swing da Central Sistema de Som e uma apresentação inspirada da Patife Band, acompanhada com entusiasmo pela platéia, o início do festival deste ano não poderia ter sido melhor. (Leia mais AQUI sobre a primeira safra de shows do evento), Patife Band aliás, que não tocava em Londrina há 4 anos, desde o Demo Sul 2012, fez uma apresentação digna de ser chamada de histórica – Fãs notaram falta de algumas faixas importantes do disco ‘Corredor Polonês’, mas nada que chegou a comprometer a sintonia banda/plateia.

Sábado (5/11) – No Dia seguinte, em um ambiente mais confortável, o Iate Clube – Mas que, em alguns momentos, teve a qualidade de som prejudicada pela quantidade de reverberação (Sobretudo em shows mais pesados como o do Motorocker) – recebeu nomes mais novos, como o Loladéli que fez uma apresentação bastante intensa (Mesmo tendo tocado apenas meia hora), junto à veteramos-mor como o aguardado Di Melo (Nome mais antigo do festival), que tocou acompanhado da banda londrinense Sarará Criolo. Hits de seu disco clássico (1975) como (Kilariô e A vida Em Seus Métodos Diz Calma) assim como faixas de seu disco, ‘O Imorrível’ lançado 41 anos depois… animaram a plateia. “Tenho ainda umas 400 músicas inéditas feitas… Mas nunca se sabe né? Não é porque sou ‘imorrível’ que terei tempo de gravar tudo isso(risos)”, brincou o cantor, durante entrevista, quando falou sobre os próximos projetos. História com H maiúsculo mesmo. Diferentemente do que muita gente pensa, durante esses anos todos, Di Melo continuou ainda lançando alguns trabalhos, porém, de forma independente ao longo das décadas de 80 e 90. Destaque também para as boas apresentações do Phantom Powers e o hard rock ‘uniformizado’ do Motorocker, com a apresentação mais pesada da noite.

Domingo (06/11) – No domingo o show aconteceu no Barbearia (Na Quintino Bocaiúva) e focou em bandas de peso – Não apenas de som, mas também de habilidade e virtuosismo. Como é o caso das londrinenses Hellpath, já com dez anos de estrada, e que se preparam para o próximo disco “Though the Paths of Hell”. Também de Londrina o trio de progressivo Imagery levou seus andamentos truncados e riffs técnicos para os palcos do Barbearia. Recentemente a banda lançou um single intitulçado “End of The Line“.

Quinta-feira (10/11) – Em um clima ora mais intimista, ora mais expansivo – Com shows ocorrendo na casinha e no palco principal do Bar Valentino – o Demosul reservou um dia dedicado apenas à música instrumental. Toda verve e técnica da violonista gaúcha Andrea Perrone abriram os trabalhos em uma apresentação intensa e envolvente. Entre as faixas, a cantora ainda parava para conversar com o público e contar breves histórias antes de cada faixa. Viagens e também impressões dos lugares por onde passou aparecem como inspiração para as canções da artista.

O som intimista de Andrea contrastou com o som enérgico do quarteto Greengrass Brothers, com seu Bluegrass cheio de rítmo e também irreverência. Com Bruno Lopes no banjo, Nahem Romano no baixo acústico, Daniel Romano no violão e João Victor no violino, o Greengrass Brothers animou o público, que, às palmas e gritos, acompanhou o show animado. Para o próximo ano, gravar um EP está entre os planos do quarteto

A ordenação e a melodia dos shows na casinha deram sentido ao peso sonoro e caos (No melhor sentido da palavra) dos shows no grande palco do Valentino. A londrinense Octopus Trio foi uma grandes surpresas da noite com seu jazz/rock cheio de improvisação e dissonâncias. Embora tenha já um público notório em espaços dedicados à música instrumental, o grupo – Diga-se de passagem um dos mais competentes do festival – ainda não é conhecido por grande parte do público que acabou surpreendido pelo virtuosismo e técnica dos integrantes ainda jovens (O grupo se formou nos confins do departamento de música da UEL).

Em seguida, os brasilenses do Muntchako fizeram outra apresentação de destaque da noite. Unindo percussões, samplers e dinâmicas de rítmo frenéticas, o trio fez uma apresentação curta tocando canções novas e algumas pertencentes a seus singles mais recentes ‘Cardume de Volume’, lançado no ano passado, sendo o mais recente deles.

Por fim, como uma das bandas mais aguardadas da noite, o Macaco Bong fechou a noite com uma apresentação cheia de groove e fúria. O guitarrista Bruno Kayapy, que tocou um Del Vecchio Tenor de quatro cordas, tirou sons e texturas improváveis do instrumento – soando talvez mais barulhento que uma guitarra propriamente dita.
Sexta-feira (11) – Neste dia os shows aconteceram em dois palcos: No Cemitério de Automóveis em Londrina e no Sesi. Por questões logísticas não pudemos acompanhar o evento nesta data, na qual, tocaram Etnyah, Mucambo de e Bantu, Bandinha Di Da Dó. E também no Sesi onde tocaram Montauk, Weird Family e Abacate Contemporâneo – Mais informações podem ser vistas no site do Demosul.
Sábado (12) – Na última noite do festival, novamente de volta ao Iate Clube, dessa vez com um som um pouco melhor do que no sábado anterior (Ainda bem), quem iniciou os shows foi o trio londrinense Red Mess com seu stoner rock de peso. Provavelmente a grande banda revelação da cidade em 2016, o grupo segue em uma boa fase com shows bastante elogiados um atrás do outro – Foram a única banda londrinense escalada para tocar no Ahead, mais recentemente – e se prepara para o lançamento do primeiro disco no próximo ano.

Reminiscentes do Haming Moe (Banda extinta em 2011) o quarteto paulista Mocho Diablo subiu aos palcos do Demo Sul pouco após ás 22h levando seu stoner – Com forte influência grunge – ao Iate Clube. O amigo Pedro Gonçalves escreveu melhor sobre o show AQUI
Uma das bandas de ’10 anos atrás’ como citou o início do texto, foi o quarteto Convulsão que fez sua segunda reunião do ano – Após ficar 20 anos afastada dos palcos, desde 1996. O grupo com forte influência do rock brasileiro dos anos 80, sobretudo Titãs (Da era ‘Cabeça Dinossauro’), o grupo, integrado por Marcelo Domingues (Organizdor do Festival) resgatou faixas de sua última demo intitulada ‘Na Terra da Malandragem’ – O público prestigiou, e alguns fãs antigos presentes puderam relembrar tempos antigos, tempos nos quais era mais difícil arrumar lugares para tocar na cidade.

Uma festa! Sim, festa… Esse foi o clima durante a apresentação do octeto de ska, rockabilly, dixie e tango Rosario Smowing, diretamente da Argentina para os palcos Londrinenses. Com repertório calcado em seu disco mais recente “No Te Prometo Nada”, lançado neste ano. O carisma e envolvimento do grupo – Que contava com teclados e também trio de metais, acompanhando a performance enérgica do vocalista Diego Casanova que pulou, dançou e até interagiu com a plateia – Emulando as vezes um curioso Sinatra latino. O público apreciou bastante.

Em sua segunda apresentação pela cidade – Sendo a primeira em 2013, ainda na turnê do disco ‘Avante – o pernambucano Siba transformou o festival em um verdadeiro baile regional, fazendo com que muitos presentes pulassem e entrassem em rodas embalados pelo seu rock/manguebeat cheio de melodia e também com letras inteligentes. Faixas do trabalho mais recente do pernambucano, o disco ‘De Baile Solto’ (2015) como ‘Marcha Macia’ cativaram grande parte da plateia em um dos shows mais aguardados do festival. Destaque para o som do show, talvez o melhor em termos de qualidade (equalização) apresentado nos dois dias do festival.

Por último, mas nem de longe menos importante, restou ao gaúcho Edu K, e seu De Falla finalizarem os trabalhos de 2016. Injustiçados talvez pelo horário, e pela bombástica apresentação anterior – Como competir com um show que acabou de colocar centenas de pessoas pra dançar? – O trio subiu ao palco por volta das 2h30 da manhã, em um horário no qual boa parte do público já havia partido. Amparado por vários samplers e batidas de funk, o trio fez uma apresentação animada e cheia de colagens sonoras, misturando Tim Maia com rap americano, e até injetando groove na música dos Rolling Stones “Vamo empolgar como se a casa estivesse cheia”, brincou Edu K em um momento mais descontraído do show. Por fim, cantando o hit ‘Popozuda’, o músico desceu do palco, abrindo espaço na grade e chamou o público para cantar junto o refrão de uma das músicas mais tocadas no Brasil no final da década de 90. Show enérgico! As cerca de 40/50 pessoas presentes apreciaram.

No fim, o saldo do festival foi bastante positivo, com destaque para a variedade de gêneros, e também, qualidade das atrações. Algumas delas como o emblemático Di Melo, e o próprio De Falla (Que sim, é uma banda referência, surgida em uma época na qual pouco se cogitava misturar rock e funk) por não serem nomes de destaque para o grande público, seriam shows improváveis aqui na cidade foram de iniciativas como festivais, logo, a oportunidade de conferir nomes como esses sempre é válida. O preço foi criticado por algumas pessoas presentes, nos dias de Iate o valor chegou a R$ 40 em um ingresso inteiro, o que não é exatamente caro considerando a variedade de bandas, embora possa ser visto como um valor alto, considerando o atual momento de crise em todo o país. O evento se consolida como um importante foco de produção cultural, e também vitrine de artistas locais – A qualidade das bandas londrinenses foi um dos destaques – Embora, considerando seu papel dentro da cidade, valeria pensar em iniciativas futuras como por exemplo, atrações localizadas em bairros fora da região central o que, em tese, permitiria à públicos novos ter contato com novos artistas, e assim, fomentar criação de público para shows e festivais futuros. A falta de espaços para shows em outros bairros ainda pode ser um impedimento para isso, mas vale a reflexão.